Redução dos juros, combate ao importacionismo, contrapartidas sociais nos financiamentos públicos e Contrato Coletivo Nacional. Estas foram as principais propostas aprovadas no Seminário de Política Industrial realizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores no Vestuário (CNTV/CUT), que reuniu cerca de 60 lideranças sindicais de dez estados na última sexta-feira (18) em São Paulo.
Mais do que nunca, apontou a presidenta da CNTV, Cida Trajano, “é hora de defender o nosso mercado interno da enxurrada de produtos importados, baixar os juros e criar mecanismos de estímulo à produção nacional, com empregos decentes e salários dignos”. “O Contrato Coletivo Nacional contribuirá para garantir um patamar mínimo de direitos e fazer frente à guerra fiscal, pois os Estados têm utilizado a precarização e os baixos salários para atrair empresas. Também defendemos que os investimentos públicos, como o de programas como o Brasil Maior, carreguem consigo obrigações, contrapartidas sociais, que comprometam as empresas com a melhoria da qualidade de vida e trabalho”.
Para Cida, a agudização da crise internacional, que alastra o desemprego e a miséria na Europa e nos Estados Unidos, deve nos servir de alerta e estímulo às nossas defesas. O fato, destacou, é a que a nossa indústria têxtil e de confecção encontra-se extremamente vulnerável diante da contínua invasão de importados, pois a China tem driblado as barreiras que conseguimos levantar.
Conforme projeções da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), o setor têxtil e de confecção deve fechar o ano com déficit comercial 43% superior ao registrado no ano passado, com as importações superando as exportações em US$ 5 bilhões. O déficit projetado pela entidade empresarial é mais do que o dobro do que o registrado em 2009, de US$ 2,25 bilhões. Só as importações da China subiram 31% de janeiro a setembro últimos.
No ano passado, o Brasil passou a importar mais calçados da Malásia, 1.356% e Indonésia, 93%, e até de países onde praticamente inexistem fábricas do produto como Taiwan, 428%, e Hong Kong, 132%, o que reforça as suspeitas de que, por meio de triangulações, os sapatos chineses acabem se livrando da sobretaxa de US$ 13,85 o par. A taxação ocorreu após manifestação conjunta de entidades sindicais de trabalhadores e empresários.
CRISE DE PROJETO
Em sua análise de conjuntura, o secretário geral da CUT, Quintino Severo, lembrou que “o cenário de grande turbulência internacional não é só uma crise econômica, mas de projeto”. Na primeira fase da crise, recordou, os Bancos Centrais socorreram os bancos privados para evitar a quebradeira. “Agora, querem que os trabalhadores paguem o socorro ao sistema financeiro com aumento da jornada, redução de salários, direitos e investimentos sociais. A proposta deles é mais dose amarga do mesmo remédio”, denunciou.
Para Quintino, nossa resposta deve continuar sendo contrária aos descaminhos apontados pelos governos dos países centrais: “ampliar o crédito, valorizar o salário mínimo, políticas públicas que reforçam o protagonismo do Estado e os investimentos na infraestrutura e nas áreas sociais”. Daí a importância da disputa com a equipe econômica do governo e com os setores conservadores, destacou o secretário geral cutista, particularmente num momento em que o setor do vestuário sofre com a flutuação e o problema do câmbio.
A CUT desfralda a bandeira do Contrato Coletivo Nacional, reforçou Quintino, “a fim de assegurar melhores salários e condições de trabalho, pondo fim à precarização, buscando garantir o diálogo social no local de trabalho, que é um local público, não é apenas da empresa, pois ali convivem pessoas”.
Contribuindo com o debate, o deputado federal João Paulo (PT-SP), ex-presidente da Câmara, reiterou a importância de termos no Brasil um “Estado forte, indutor e condutor”, ressaltando o papel do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para criar as condições do país dar um salto no desenvolvimento.
João Paulo lembrou que o setor manufatureiro é o primeiro a sofrer as consequências da disputa predatória entre as nações e “dentro das nações”, o que obriga o governo a ter um olhar diferenciado para ramos como o do vestuário, que emprega cerca de dois milhões de pessoas.
O ex-presidente da Câmara fez eco às reivindicações da CNTV em defesa de uma redução mais acentuada da taxa de juros. “A dívida do país é quase R$ 2 trilhões. Se o Brasil paga 1% a menos é R$ 20 bilhões a menos para o sistema financeiro e para os especuladores e R$ 20 bilhões a mais para investir. O dinheiro público pulveriza na mão dos rentistas”, disse.
O parlamentar petista citou ações do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIV) em defesa de arranjos econômicos locais como no setor de lâmpadas, luminárias e reatores. O Brasil hoje apenas importa produtos, como da Philips e GE, “a única fábrica brasileira que produz um pouco é a Osram, que sobrevive num cenário de disputa predatória”. Sem apoio, acrescentou, “a competição fica difícil para qualquer indústria nacional”.
O papel daninho dos conglomerados de mídia que, torcendo contra o governo, distorcem o noticiário, foi apontado por João Paulo como um grave problema a ser superado, já que a população fica refém de pautas que refletem os interesses dos seus donos e anunciantes.
Homenageado pelo evento, o ex-presidente da CNTV, Jaci Pinheiro da Silva, destacou o compromisso de cada um dos dirigentes em consolidar o projeto cutista, fortalecendo a disputa de hegemonia com uma visão classista, enraizada no chão da fábrica, na luta por liberdade e autonomia sindical.
Ao final do evento foi lançada a Revista Especial da CNTV e a proposta para o novo site da entidade, que deve ir ao ar em janeiro.