Uma campanha mundial para denunciar a continuidade da escravidão de crianças e trabalhadores do Brasil está sendo iniciada na Suíça, com a participação da Comissão Pastoral da Terra (CPT), um dos órgãos ligados à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Os documentos básicos da campanha afirmam que, apesar da abolição da escravatura, em 1888, o Brasil continua a registrar novas formas de escravidão em que seres humanos trabalham em condições desumanas, em fazendas, minerações e fábricas clandestinas.
Mais de 40 mil brasileiros, entre os quais muitas crianças, estão condenadas atualmente a uma situação de “escravidão moderna”. É grande o contingente de crianças trabalhadoras: para cada 10 crianças brasileiras, uma trabalha; são 866 mil crianças de 7 a 14 anos alistadas como trabalhadoras no Brasil. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho – OIT, esse número inclui apenas as crianças empregadas nas piores modalidades de trabalho infantil, tais como o trabalho escravo forçado, a venda e o tráfico de pessoas, as atividades ilícitas, tais como a produção e trafico de drogas, os trabalhos perigosos a saúde infantil (como o corte de cana e a fabricação de tijolos) entre outras atividades.
As estatísticas oficiais omitem, por exemplo, as prostitutas mirins e as milhares de crianças, geralmente meninas, que fazem trabalhos domésticos no Brasil. De acordo com o padre Xavier Plassat, um sacerdote dominicano que trabalha no Brasil há 22 anos – e que coordena a campanha internacional contra o trabalho escravo –, empregar crianças no trabalho doméstico, muitas vezes em idade bastante precoce, é uma prática muito comum e bem aceita no país. Apesar de prejudicar profundamente crianças e adolescentes, a carga de trabalho é muito pesada e a maioria das crianças não consegue frequentar a escola. Por outra parte, essa atividade acontece de forma escondida, tornando-se difícil vigiar e normatizar esse tipo de exploração da força de trabalho infanto-juvenil.
Saúde mental
Existem hoje, no Brasil, cerca de cem mil crianças de sete a dezoito anos abandonadas nas ruas das cidades médias e grandes; são obrigadas, pelas circunstâncias da vida, a ficar distantes do convívio familiar; sua rotina é a violência e a privação do acesso a condições dignas de vida. Pesquisa sobre a saúde mental de crianças e adolescentes, criadas em instituições sérias e respeitadas, verificou, em 2012, que essas crianças apresentavam um risco de transtornos psiquiátricos seis vezes maior em relação àquelas que viviam com suas famílias. A campanha mundial, cujo lema é “vigiar para evitar a escravidão”, tem apoio da ONG Brücke Le Pont.
Propostas
Além de fazer essas denúncias, a campanha apresenta diversas propostas para o enfrentamento desse problema. Em primeiro lugar, a realização de um estudo detalhado e multidimensional das situações que envolvem a infância e a adolescência, seja no Brasil, seja nos outros países do mundo, para efeito comparativo. Os coordenadores da campanha, Xavier Plassat e Marie-Leila Coussa, partem do pressuposto de que as crianças e os adolescentes submetidos ao trabalho escravo “não devem ser considerados apenas como vitimas passivas e beneficiarias de medidas voltadas para ajudá-las. Essa postura, além de ser pouco eficiente ao longo do tempo, tende a ser preconceituosa, mantendo os jovens como perpétuos marginalizados e perdedores; “crianças e adolescente estão em grave risco, mas a palavra risco guarda em seu significado a noção de ganho”.
Fonte: Carta Maior